ENTENDENDO A IGREJA PROFÉTICA
- Robson Tavares
- 2 de nov. de 2018
- 10 min de leitura

Habacuque 1 No pequeno texto profético de Habacuque – considerado por nós um dos profetas menores, na realidade um grande profeta com uma mensagem sucinta - existem alguns versículos que costumamos usar quando queremos falar das grandes obras de Deus. Sem perceber usamos esses versículos tirando-os de seu real contexto, o que não diminui em nada a grandeza da promessa de Deus! Os versículos são: "...porque realizo, em vossos dias, obra tal, que vós crereis, quando vos for contada" (1.5). "Mas o justo viverá pela fé" (2.4). "Pois a terra se encherá do conhecimento da glória do Senhor, como as águas cobrem o mar" (2.14). "O Senhor, porém, está no seu santo templo; cale-se diante dele toda a terra" (2.20). E o grande texto que expressa o clamor de todos nós: "Aviva a tua obra, ó Senhor, no decorrer dos anos, e, no decurso dos anos, faze-a conhecida" (3.2). Na realidade, essas expressões do profeta surgiram no meio de notícias aterradoras. O profeta quando ouve de Deus as terríveis notícias de que os caldeus invadirão sua cidade e destruirão sua nação, se angustia e, apela para o caráter misericordioso de Deus. Depois, resolve se recolher à oração, vigília e meditação e esperar em Deus. E ali em sua torre de vigília ouve Deus falar – uma resposta que não dá muita esperança ao profeta! Deus não acena com a libertação do povo das mãos dos caldeus. A nação teria que passar por esse tempo de tribulação. Na atitude do profeta diante da resposta negativa que recebe de Deus, encontramos a mensagem que pode fazer de sua congregação uma igreja profética. Habacuque se desespera diante do quadro social que vive a nação. A violência tomou conta de todos os segmentos da sociedade. O governo federal sente-se impotente, os moradores das cidades não têm mais sossego. A cada dia enormes cercas com fios elétricos são levantadas, empresas de segurança acionadas, alarmes, vídeos e guaritas com vigilantes a cada quarteirão tentam minimizar a invasão de nossas cidades por gente má e arruaceira. O sistema prisional e penal está falido, e a corrupção e violência institucional corroem os mais altos escalões do governo. Assaltos com mortes e fuzilamentos sumários deixam a sociedade acuada diante do medo que lhe é imposta. Habacuque viveu naqueles dias o que vive hoje a igreja brasileira. Ele clamou: "Até quando, Senhor, clamarei eu, e tu não me escutarás? Gritar-te-ei: Violência! E não salvarás? Por que me mostras a iniquidade e me fazes ver a opressão?" (Hc 1.2-3). Primeiro. O profeta deixa claro que a verdadeira igreja profética é sensível a toda prática do mal. A igreja deve demonstrar sua preocupação a Deus diante de coisas que acontecem na sociedade. Para muitos a violência já é coisa normal, mas o profeta não se submete à violência: expõe diante de Deus o seu clamor. A igreja tem de ser sensível ao maligno. Não consegue se calar ao ver o povo sofrer sob a mão do diabo. Ela entende que a violência urbana, a opressão espiritual, a pobreza, as enfermidades e o sistema iníquo de governo que oprime cada vez mais o povo, são conseqüências da atividade satânica que mata, rouba e destrói o ser humano. Ela reconhece sua fragilidade diante de tanta malignidade, mas se firma cada vez mais no poder de Deus! Além de ser sensível ao mal ela é também sensível às necessidades humanas, pois encarna o coração misericordioso do próprio Deus. Habacuque argumenta: "Deus, não faz parte de teu caráter a insensibilidade diante da opressão. No entanto, por que te calas, e deixas a violência aumentar ?" (1.13 paráfrase). É o tipo de argumentação permitido. O profeta não se conforma com o silêncio de Deus e pergunta: "Até quando?". Uma coisa é discutir com Deus, outra é empenhar a Deus com sua própria palavra! Se a igreja não puder argumentar com Deus a respeito da maldade que assola a terra com quem irá conversar? A verdadeira igreja profética não discute seus temas e assuntos em foros humanos, mas com Deus! Ela já está bem ciente das necessidades espirituais e sociais ao seu redor. O problema é quando a igreja se torna insensível. Há uma diferença entre ser insensível e esperar pela ação de Deus! Diante de sua argumentação, o profeta ouve Deus lhe responder: "Habacuque, a coisa vai piorar!" E aqui o versículo que usamos para falar de tempos de prosperidade, Deus usa para falar de um tempo mais difícil para a nação. Ele ouve de Deus a sentença: "Porque realizo em vossos dias, obra tal, que vós não crereis, quando vos for contada". Condoída e sensível ao Mal que aflige seus cidadãos, e diante da resposta negativa de Deus, o profeta não se deixa dominar pelo temor de piores dias, e mostra o que uma igreja profética deve fazer quando as coisas tendem a piorar. O profeta decide orar. Para isso escolhe a torre onde ficavam os sentinelas da cidade. Ali ele quer vigiar a aproximação do inimigo e esperar a resposta de Deus! E quando se propõe ouvir que resposta Deus tem à sua queixa, Deus lhe fala em alto e bom som: "Escreve a visão com letras grandes e visíveis. Coloca em painéis à beira da estrada para que, até o que passa a 120 k/h leia" (Paráfrase do autor). Isso nos leva a uma segunda verdade. A Igreja profética vive acima da mediocridade, acima do trivial; vive ouvindo de Deus! Ao invés de buscar suas respostas no mundo, a igreja precisa esperar mais em Deus. Ele tem em suas mãos o controle do Universo. Nas suas mãos está o controle da ciência, das armas de guerra, da mente dos poderosos! A Igreja sai do terreno comum quando ouve de Deus! A verdadeira igreja tem o DNA de Deus em seu corpo! Não é alienação. É envolvimento social diretamente com Deus. A verdadeira igreja profética está sempre disposta a ouvir de Deus! Não dá o primeiro passo sem que Deus dê as ordens! Vive longe dos foros humanos porque tem acesso ao trono, ao comando central de Deus! Na torre da vigília e da oração Deus se manifesta. Foi assim com os 120 no cenáculo que estavam orando quando o Espírito Santo desceu; quando foi perseguida, Deus falou estremecendo o lugar onde oravam; quando os apóstolos eram presos, lá estava a igreja na torre de vigília esperando em Deus! É o próprio Deus que tira a igreja de seu lugar de oração e a envia às ruas. "Vai para as ruas e anuncia em letras bem grandes...". A verdadeira espiritualidade do povo de Deus reside nessa tensão entre estar diante de Deus sem deixar de estar diante do povo! Ou vice-versa! Vivemos sobre o tênue fio que liga o ser e o fazer; o místico e o pragmático, a fé a razão! E é dentro desse contexto que Deus afirma que o justo viverá pela sua fé. "Habacuque, as coisas irão piorar. Você acha que está ruim? Vai ficar mais ruim ainda! Mas o meu justo não depende do bom e do mal para viver; não depende se as coisas vão bem ou ruim. O meu justo, Habacuque, vive pela sua fé"! É devido a essa grandeza divina que "a terra se encherá do conhecimento da glória do Senhor, como as águas cobrem o mar" (2.14). O conhecimento de Deus nem sempre vem pela prosperidade, ou por tempos bons, mas também nas coisas ruins! Essa declaração de Deus da fé e do conhecimento, catapultam a igreja a um terceiro aspecto. A Igreja profética vive uma oitava acima das demais igrejas. Enxerga as coisas pelo ângulo de Deus! Não nos impressionamos quando alguém ao nosso lado canta conosco a mesma melodia só que uma oitava acima? Se tentarmos, não vamos conseguir! A igreja profética também vive uma oitava acima das demais igrejas! Apesar do quadro triste que Deus abre diante do profeta o que ele vê no capítulo 3? Dos versículos 3 ao 16 ele vê Deus em ação! "Ouvi-o e o meu íntimo se comoveu" (3.16). Será que vemos o mundo pela ótica de Deus ou estamos nos deixando contaminar pela ótica do mundo? O mundo vai melhorar ou piorar? Como Deus vê? Ele diz: Depois que vi tudo isso, o meu íntimo ficou tocado! Habacuque viu a destruição e se comoveu! Não é assim conosco: Se Deus dissesse que iria destruir o Carnaval, matar o povo, etc. como se comportaria o nosso coração? Vibraríamos de alegria e prazer ou nos comportaríamos como Moisés? E como se comportou Jesus diante do pecado e dos problemas das pessoas? Quando ela vive na dimensão do Espírito Santo sai da dimensão humana, da mediocridade, do comum. Por isso o grito do profeta: "Aviva a tua obra, ó Senhor, no decorrer dos anos..." (3.2). Da torre de vigia o profeta viu Deus agindo. Eis aí a razão de seu clamor! A Igreja verdadeiramente profética passa a freqüentar o Trono, lugar das decisões. Como a Igreja de Atos dos Apóstolos. Ali o Espírito Santo governava: falando, avisando, enviando, enchendo de poder, capacitando, guiando, impedindo, estabelecendo, levantando ministérios, etc. Quarto. Se a igreja é profética e vive uma oitava acima das demais, ela passa a ser também uma igreja luminosa e explosiva. Onde os demais vêem derrotas, ela vê a vitória! Não é pensamento positivo! O Pensamento positivo ignora as dificuldades. A Igreja vê dificuldades, mas sabe que tem de vencer! A igreja profética vê a Deus e isso faz dela uma igreja iluminada e explosiva! O importante para o profeta é que ele via a Deus se aproximando! No meio do horror que vê, ele recebe um raio de luz e exclama: "Aviva a tua obra, ó Senhor!" Uma igreja que não olha para as circunstâncias! O profeta Habacuque deixa a dica. Ele sobe para a torre para vigiar e ouvir de Deus e logo tem de descer, porque é iluminado com a resposta de Deus. Explode num cântico de louvor e adoração que é o capítulo 3. Ela é explosiva quando sai de seu lugar de oração e parte para a ação. Jesus não queria que os discípulos ficassem no Monte das Oliveiras e montassem acampamento esperando sua vinda: "Vão! Preguem por todo o mundo", disse. E quando os apóstolos decidiram ficar na torre orando e estudando – depois dos incidentes de Atos 6 – ele levanta um diácono iluminado e explosivo, Estêvão, que decide confrontar novamente as autoridades eclesiásticas de seu país. Parece que Deus estava dizendo: "Tudo bem. Já que vocês só querem estudar e orar, vou usar os diáconos. Vou levantar outras pessoas". E levanta a Filipe, e depois a Saulo de Tarso que dá novo vigor à igreja! A igreja profética não fica apenas em vigílias de oração, tão importantes para ouvir de Deus. Quando ouve de Deus, obedece e parte para a ação! A verdadeira igreja profética vê Deus em ação! Deus mostra situações difíceis ao profeta, mas ele não vê derrotas: Vê ação! "Deus vem de Temã". O que aconteceu em Temã? Foi lá que se manifestou ao povo de Israel (Dt 33.2; Sl 68.7). O profeta ouve o barulho do mundo espiritual (3.16). "Ouvi-o e meu íntimo se comoveu". A igreja ouve o barulho de Deus chegando! Elias ouvi-o em forma de abundante chuva. Eliseu viu os carros de fogo cercando sua cidade; Davi ouviu o ruído da cavalaria de Deus sobre as amoreiras. Temos visto a ação sobrenatural de Deus? (Anjos cantando, vento soprando, etc.)? O que temos ouvido? Só conseguimos ouvir e ver pela fresta da revelação de Deus se estivermos na Torre da oração! Precisamos ter aquele ouvido de João Milton, de O Paraíso Perdido que conseguia ver o que outros não viam! Olhos e ouvidos de poetas que vêem e escutam o que se nos passa desapercebido! Abraão via a cidade que tem fundamentos, a Igreja, que ainda se manifestará no fim dos tempos (Hb 11.10). Isaque viu as coisas que estavam para vir quando abençoou Esaú e Jacó (Hb 11.20). Jacó via o futuro do mundo quando, apoiado em seu bordão, adorou a Deus. José via o povo entrando em Canaã e deu ordens a respeito de seus ossos! ((Hb 11.22). Moisés decidiu pagar o preço porque via o galardão – ainda para vir! (Hb 11.26). Jesus suportou a morte de Cruz porque viu a ressurreição de antemão! (Hb 12.2). E nós o que vemos e ouvimos? Estamos trabalhando e construindo sobre o que Deus nos mostra ou sobre planos humanos? E isso nos leva ao último ponto: A Igreja profética tem uma visão multidimensional da história da humanidade, de seus acontecimentos e vê que nenhum movimento no programa dos homens é dado sem a permissão de Deus! Ela não enxerga só o que está à sua frente; mas tem uma visão geral do mover de Deus ao longo de gerações! Não pode esquecer dos feitos do passado, como fez o povo de Israel. (Jz 2.10). Tem que viver o presente, ciente de sua história no passado! Por isso a igreja pode transformar as más notícias num cântico de louvor a Deus! Como Habacuque que no final de seu cântico, diz: "Ao mestre de canto. Para instrumentos de cordas". Onde todos viam derrotas, Habacuque, uma figura da igreja profética via a mão de Deus! Ele passou a dizer: "Mesmo não florescendo a figueira, e não havendo uvas nas videiras, mesmo falhando a safra de azeitonas, não havendo produção de alimentos nas lavouras, nem ovelhas no curral, nem bois nos estábulos, ainda assim eu exultarei no Senhor e me alegrarei no Deus da minha salvação" (Hc 3.16-18 NVI). Por que Habacuque demonstra tanta confiança apesar das más notícias? Porque o profeta tinha ciência da história de seu povo e da ação de Deus ao longo de milhares de anos! A igreja profética por viver acima do trivial, por viver uma oitava acima das demais e por ter uma visão multidimensional da obra de Deus - passado, presente e futuro – não depende de cultos de avivamento para sobreviver; nem de farturas de alimentos para crer. Muitos são os que se deleitam em cultos de avivamento e de poder, mas depois desistem diante das dificuldades. A verdadeira igreja profética, tira das dificuldades, vitória! Está firme em Deus! Precisamos estar no Monte da Transfiguração sem esquecer que existe coisas a fazer lá embaixo! (Mt 17). A igreja que vive nessa dimensão entoa um novo cântico, mesmo diante das dificuldades. Lutero, diante do terror e das ameaças do Papa, escreveu o belíssimo Castelo Forte: "Se nos quiserem devorar, demônios não contados, não nos podiam assustar, nem somos derrotados; o grande acusador, dos servos do Senhor já condenado está, vencido cairá; por uma só palavra!" Joseph Scriven, mesmo desgastado pelos fracassos da vida, depois de ver o sonho de ser militar frustrado, e de duas noivas – em ocasiões diferentes - morrerem às vésperas do casamento dele, ao receber a última triste notícia de que sua mãe estava à beira da morte na Irlanda e ele no Canadá, sem ter meios de acompanhá-la na hora da morte, à beira de um rio, morreu afogado num palmo de água, ajoelhado diante de Deus. Ele nos legou o famoso cântico: "Em Jesus amigo temos; mais chegado que um irmão!" É diante das piores situações que o homem tem vislumbre da ação e do poder de Deus! A Harpa Cristã diz: "Os mais belos hinos e poesias foram escritos em tribulação". Ao viver nessa dimensão, a igreja pode dizer como Davi no Salmo 108.1-5! "Firme está meu coração, ó Deus!" Concluindo, devo dizer à Igreja brasileira que não se iluda com as promessas de prosperidade, nem se acomode diante do conforto e da liberdade que tem. Se a igreja se acomodar e não levantar a voz a favor dos pobres e necessitados, se não se levantar contra o Inimigo de Deus e se não denunciar as obras das trevas de nossas autoridades governamentais – e também de certos pastores – viverá na mediocridade e no trivial. Mas se subir para seu lugar de vigília e ouvir a voz de Deus, por certo se tornará uma igreja iluminada e explosiva, vivendo uma oitava acima das demais! Que Deus nos abençoe!
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